sexta-feira, 27 de julho de 2012

GUERRILHA DO ARAGUAIA:OS BASTIDORES DA GUERRA SUJA


*Artigo produzido a partir do resumo de meu TCC(Monografia de final de curso, como era chamado na época-Originalmente escrito e defendido entre setembro de 1995/dezembro 1996-UNISUAM/RJ-Orientadora: Esther Kupperman, apresentado no Encontro Nacional da Universidade HUMBERTO CAMPOS/ Vassouras-RJ,1997. UNICAMP/Campinas/1999;USP/SP,1999;UFSC/SC1999,UFBA/BA,2000;UFRS/RS,2000,UFF/Niteroí,2000,UFRJ/RJ,2000.

Desaparecidos do Araguaia
GUERRILHA DO ARAGUAIA: OS BASTIDORES DA GUERRA SUJA
O final dos anos 60 e início dos anos 70 foram sacudidos pela truculência do Ato Institucional Nº 5, o famoso e temível AI5.
O mundo caminhava dividido entre bloco socialista e o capitalista, pela manutenção de uma só hegemonia político econômica(A Guerra Fria).
Na América do Sul, Argentina, Chile, Venezuela, Uruguai e Brasil, sofreram com essa ordem político social, imposta pelo bloco capitalista encabeçado pelos Estados Unidos. É neste contexto que vamos tentar mostrar como foi a resistência ao sistema de força imposto pelo Golpe Militar de março de 1964 e endurecido após o AI5, nos chamados anos de Chumbo, decretado por  general Costa e Silva e levado ao extremo por general Emílio Garastazú Médici.
A Guerrilha do Araguaia foi o foco de maior resistência de luta armada no Brasil, aonde foi necessário empregar pelas Forças Armadas, um contingente muito superior ao de outros embates, pois não se esperava encontrar um grupo tão bem  treinado e com tanta resistência a força bruta. Nas duas campanhas ocorridas em 1972, duas derrotas vergonhosas para as Forças Armadas, até que na terceira campanha, apoiado pela inteligência do exército, espiões infiltrados, um longo treinamento e nenhum escrúpulo, as forças de repressão conseguiram debelar o último foco de resistência ao sistema ditatorial imposto ao país.
A importância da Guerrilha do Araguaia se dá no momento em que as guerrilhas urbanas já haviam sido sufocadas, e mostra como é possível travar uma luta no campo com situações bastante adversas.
Este capítulo da História recente do Brasil, não pode e nem deve cair no esquecimento, por ser um dos fatos mais marcantes no que toca a humanização da luta. Os personagens dessa história, e sua esmagadora maioria eram jovens que ousaram sonhar com um mundo melhor, com um país livre e igualitário para todos os brasileiros.

Mapa da região onde  ocorreu a Guerrilha do Araguaia
  
A FORMAÇÃO DE UMA GUERRILHA
Pretendia-se iniciar uma luta armada no país, aplicando a linha revolucionária utilizada na China e em Cuba, ou seja do campo para a cidade.
A região do Araguaia apresentava as condições necessárias para tal evento. É uma zona de mata fechada, não sendo possível a utilização de tangues, artilharia e bombardeio aéreo. É necessário estar a pé dentro da mata. A região também é de grande pobreza, com povoados e cidades pequenas.
Inicialmente, pensava-se em construir três frentes de luta: uma em Goiás, Maranhão e Araguaia. Goiás desmantelou-se por causa de inúmeros erros e a do Maranhão foi denunciada, ficando somente a do Araguaia.
As condições urbanas não eram das mais favoráveis, pois todos os focos de resistência haviam sido desmantelados entre 1969-1972, devido a total falta de garantias advindas do AI5, torturas e assassinatos dos principais líderes. Por isso a resistência no Araguia se mostrava cada vez mais necessária.
Organizada pelo PCdoB (Partido Comunista do Brasil), a  Guerrilha do Araguaia foi uma das maiores insurreições ocorridas no Brasil  desde a Guerra de Canudos e a maior concentração das Forças Armadas desde  a participação na II Guerra Mundial.Ao todo foi mobilizado cerca de 20 mil homens, desloca-se vários estados, cria-se novos batalhões de selva,trazem técnicos militares de outros países, investe-se contra a Igreja ,apoia-se latifundiáros da região e por um tempo é necessário abandonar os planos de “colonização” da Amazônia.


Forças Armadas chegam ao Araguaia

Tudo isso deixava a “Segurança Nacional” preocupada, pois para todos os efeitos, no Brasil, tudo ia bem, o povo estava feliz,, não havia inflação, a classe média conhecia  o  paraíso e o país “crescia dentro da lógica do Milagre Econômico”.Obras de faraônicas aconteciam, o INCRA e as Operações ACISO cobriam todas as necessidades do povo.
Os primeiros militantes começaram a chegar à região em 1966. Liderados por Osvaldão(Osvaldo Orlando da Costa), tinham a missão de preparar o terreno, construindo sítios e buscando o apoio dos camponeses. Tanto o PCdoB como os militares dividem a guerrilha em três campanhas distintas. A primeira iniciada em abril de 1972, se deu quando as forças oficiais (Exército, Marinha e Aeronáutica), promoveram  missões de reconhecimento , batizadas como Operação Peixe, Operação Ouriço e Operação Olho Vivo.Foi mobilizado 170 homens e 40 dias de puro fiasco. A Guerrilha comemorou vitória.
A segunda campanha, a Operação Papagaio, se deu entre setembro e outubro de 1972,novas manobras foram executadas na região desta vez uma Brigada de Infantaria e a Brigada de Paraquedistas, um contingente de Fuzileiros Navais e uma ala numerada da Força Aérea, cerca de 3.600 homens combateram por 12 dias  na maior mobilização desde a II Guerra.
Até esse momento, os fatos se desencadeavam dentro da normalidade.Os mortos em combate do lado guerrilheiro, eram enterrados no cemitério público, sem identificação, é claro, e todos os prisioneiros  desta fase voltaram vivos.
A partir da Trégua de 11 meses, nada mais está registrado.De novembro de 1972 a setembro de 1973 nenhuma baixa, nenhum combate. As forças repressivas usaram esse período para articular a inteligência militar, infiltrando 35 agentes secretos, todos mestiços, entre os  guerrilheiros e moradores da região. Esse período de espionagem e infiltração foi dado o nome de Operação Sucuri. Em pouco menos de 1 ano tinham-se os nomes, os locais de esconderijo e as rotas guerrilheiras.
Com as informações necessárias, inicia-se a Operação Marajoara, que trucidou a guerrilha e seus guerrilheiros.Entre 7 de outubro de 1973 a setembro de 1974,750 membros das Forças Armadas: os boinas pretas do Exército;os paraquedistas e os boinas verdes, de combate nas selva entraram na mata a paisana com uma única missão, eliminar todos os guerrilheiros. Não era captura e prisão como nos códigos de guerra normais, mas eliminação física e sistemática, entre os que eram presos ou se entregavam espontaneamente. Foi neste período que as violações aos direitos humanos, como tortura a moradores, simpatizantes e guerrilheiros. Nesta ultima campanha foram assassinados 47 guerrilheiros e um número incerto de camponeses. Apenas dois militantes saíram com vida: João Amazonas e Ângelo Arroyo(ambos desertores da guerrilha).
DESCOBRE-SE O FOCO DA GUERRILHA
O Exército toma conhecimento do foco de guerrilha existente no sul do Pará, ao prender o estudante Pedro Albuquerque e sua namorada Ana Cristina, ambos sem documentos de identidade, no Aeroporto de Fortaleza, em 1971. Interrogados na sede da Polícia Federal, os dois revelaram a existência de guerrilheiros no Araguaia.
“Segundo relatórios oficiais, publicados no Jornal do Brasil, em março de 1992. A região do Araguaia, hoje conhecida como Bico de Papagaio, já recomendava ações do governo para evitar revoltas, como a implementação de uma reforma agrária de emergência, com o  objetivo de conquistar a simpatia das populações locais.”[1]
 [1] Relatório Especial de Informações nº 2/12, protocolo 2.309, de 20 de março de 1972
Do Tenente Coronel Arnaldo Bastos de Carvalho Braga
Para o Ministro do Exército Orlando Geisel – Publicado pelo Jornal do Brasil em 22/3/91-1°Caderno Pg.19
Pedro e Ana haviam fugido do Destacamento C, por ela estar grávida e ter recebido ordem do comando para abortar, a partir desta fuga foram tomadas medidas de segurança.Em março, o Comando Geral da Guerrilha toma conhecimento da prisão do casal, e logo em seguida inicia-se a OPERAÇÃO AXIXÁ.
Os conflitos iniciados em março de 1972, quando os primeiros militares chegaram à região, hoje conhecida como Bico do Papagaio, na confluência entre os estados do Pará, Maranhão e Goiás (hoje Tocantins), e que só terminaria em setembro de 1974, quando os últimos guerrilheiros foram abatidos.De acordo com o PCdoB 75 guerrilheiros e 15 camponeses foram mortos neste período. Mas há mais dez pessoas desaparecidas na região, segundo o Exército, mortas por “justiçamento” pelos guerrilheiros, além de seis militares mortos em confronto. Nesta conta rolam 95 pessoas, das quais 80 permanecem desaparecidas até hoje, somente dois corpos foram identificados, o de Lucia Maria Petit e Bergson Gurjão Farias.
O Exército chegou a região usando de violência indiscriminada contra a população nativa. Por volta de 12 de abril o Destacamento A foi atacado.Em 14 de abril o ataque acontece ao Destacamento C. A Comissão Militar(CM) enviou o guerrilheiro Geraldo(José Genoíno) para avisar ao Destacamento B, porém este é preso. Do Destacamento A Nilo (Danilo Carneiro) também é preso.


Chegada das tropas ao Araguaia

COMO SE ORGANIZAVA A GUERRILHA DO ARAGUAIA
Dividido em três Destacamentos, contavam com 63 guerrilheiros. O Destacamento A, com 22 pessoas sendo Zé Carlos (André Grabois) o comandante, o Destacamento B com 21, tendo Osvaldão como comandante, no Destacamento C com 20, sendo Paulo (Paulo Mendes Rodrigues) o comandante. A Comissão Militar CM) composta de 4 membros.
Possuíam reservas de alimentos, roupas, remédios e munição. As armas eram precárias num total de 60 entre fuzis, metralhadoras, rifles, espingardas e carabinas.Todas apresentavam algum tipo de problema por serem antigas e com pouca manutenção. O Destacamento A, apresentava mais problemas em abastecimento de alimentos e armamentos.
Guerrilheiros mortos na Primeira e Segunda Campanhas
A Área de atuação ia de São Domingos das Latas até o rio Caiano, numa extensão de cerca de 1.300km de comprimento e 50km de fundos,dando um total de 6.500km. A população desta área contava com 21 mil habitantes e os principais produtos de comercialização são: Castanha do Pará, Babaçu, Arroz, Mandioca e Milho.A área também é propícia a caça.

A REPRESSÃO E A GUERRILHA: PRIMEIRA E SEGUNDA CAMPANHAS
Na primeira operação, a população local resistiu em colaborar na localização de acampamentos e informações sobre os paulistas*. Os militares partiram para o uso da força,obrigando por meio de ameaças e torturas que os camponeses servissem de guias, porém os mateiros enganavam os pelotões , levando-os a caminhar em círculos por dias no meio da floresta.
Na segunda operação, o Exército não usou um grande contingente, ocupando algumas sedes de castanhais. Foi usados aviões e helicópteros e os rios ficaram sob o comando da Marinha. Nesta fase, as tropas não entraram na mata, movimentando-se pelas estradas e montando emboscadas nas imediações das casas dos camponeses,nas roças e estradas de menores acessos. O uso de propaganda também foi largamente usado em que os guerrilheiros eram apontados como assaltantes, subversivos e terroristas. Houve torturas e prisões contra os camponeses. Muito bate paus* foram recrutados para ajudar na localização dos guerrilheiros. Nesta operação foram localizado e destruído vários paios de milho, arroz e castanhas, além de cortarem várias árvores frutíferas. As prisões continuam, e agora são voltadas aos membros eclesiásticos.As informações que as forças de repressão possuíam não eram concretas, era necessário obtê-las a qualquer custo.

*Paulistas: denominação usada pelos nativos para identificar os guerrilheiros, pois muitos vinhas na região Sul e Sudeste.
*Bate paus:indivíduos armados e postos a serviço da Polícia rural em locais aonde é deficiente ou não existe força pública.

Fotos da Guerrilha:Guerrilheiros e Forças Repressivas
FERIDAS ABERTAS DE AMBOS OS LADOS
Durante o período de 11 meses- novembro de 1972 a outubro de 1973, que se classifica como Trégua, muita coisa aconteceu e é justamente esses acontecimentos que nem o Exército como o PCdoB, continuam  a  se recusar em abrir seus próprios arquivos.Do lado militar, há um abuso concreto aos Direitos Humanos e a Convenção de Genebra. Torturaram, mataram e deixaram corpos insepultos ou sepultados de forma clandestina. São mais de 50 desaparecidos depois de serem presos (ou seja, desapareceram sob a custódia do Estado).No lado do  PCdoB, a prática de “justiçamento”.Os justiçamentos foram utilizados para justificar a execução sumária dos “inimigos da revolução”. O PCdoB, cometeu pelo menos quatro justiçamentos, alguns desses julgamentos não havia provas concretas da culpa do réu.
Neste período a guerrilha cometeu vários justiçamentos em torno de pessoas que haviam ajudado as forças de repressão. Alguns dos casos, essa ajuda veio através de grileiros e jagunços a mando dos latifundiários da região.
O historiador Erick Hobsbawm chamou esses tempos de “A Era dos Extremos”, referindo-se genericamente ao Nazismo e depois à Guerra Fria. Não estava enganado, pois foi mesmo uma época de extremos.
Há nos apontamentos de Maurício Grabois, a descrição de um justiçamento, que  deveria ter sido analisado com mais cuidado pelos guerrilheiros, mas a época era de ódio e não de ponderação.
O comandante Grabois, dono do diário que nos dá uma clareza maior dos acontecimentos da época, descreveu o assunto ”justiçamento” de forma direta, justificando o tribunal implantado pelos revolucionários, e que nenhuma chance de defesa era dada ao prisioneiro.
No caso do camponês João Pereira da Silva, que na época tinha 17 anos e se encontrava casado, pais de dois filhos deixa claro esse ódio sem distinção. O garoto cumpria ordens do pai ao levar militares ao esconderijo de guerrilheiros do Destacamento B. Ninguém foi encontrado, e o garoto recebeu CR$ 50,00 pelo serviço. No período de trégua, foi preso e julgado por quatro membros do tribunal revolucionário. Segundo o Exército, o rapaz foi espancado e morto a facadas. Segundo o Diário de Maurício Grabois, foi morto a tiros.
Outro justiçamento, que é descrito no diário do Velho Mário (Maurício Grabois), é o justiçamento de Pedro Mineiro, pistoleiro-jagunço da Fazenda Capingo, era comprovadamente assassino de aluguel. Pedro Mineiro foi justiçado em casa, diante dos filhos pelos guerrilheiros.

Dina













Helenira


Osvaldão














Sonia

TERCEIRA CAMPANHA: OUTUBRO DE 1973/JANEIRO 1974- A GUERRA SUJA
 A Terceira Campanha das Forças Armadas, iniciou-se em outubro de 1973. Totalmente interados da guerrilha, pois durante o “período de Trégua”, a inteligência trabalhou muito, plantando  agentes entre os guerrilheiros, mapeando seus passos,  sabendo as localizações de cada Destacamento.Por outro lado, houve negligência à segurança por parte de alguns guerrilheiros, como foi o caso de Sônia e Zé Carlos.
As tropas entraram por diversos pontos: Transamazônica,São Domingos,Brejo Grande,São Geraldo,Palestina e Santa Cruz. Nessa campanha o terror e a violência imperaram. Todos os homens em idade produtiva, e algumas mulheres foram presos. Queimaram-se casas, paios onde não encontraram morador. Pequenos e médios comerciantes também foram presos, levados prisão de Bacabá (a terrível Casa Azul),uma espécie de campo de concentração aonde todos foram torturados, alguns enlouqueceram outros estão desaparecidos até hoje. Na periferia havia grande concentração de soldados,as tropas desta vez, eram especializadas em combate na selva, constituída de bons mateiros treinados.As bases de apoio estavam localizadas no meio da mata, e contavam com aviões e helicópteros em número muito superior as outras duas campanhas.    
  Por sua vez  as Forças Armadas contavam com 6 mil homens,mateiros, rastreadores e as armas mais modernas da época, tais como metralhadoras leves, fuzil FAL , bombas de efeito moral e rádios de comunicação.”[2]
[2] Relatório das Forças Armadas publicado no Jornal do Brasil em 22.03.92
A estratégia militar nesta fase, é quebrar a resistência popular e a implantação do medo, e isso é atingido por meio do terror, que é conseguido através da tortura, que agora é muito mais pesada do que das outras vezes.
Do lado da Guerrilha, o Destacamento A contava com 22 pessoas, o B com 12 e o C com 14, num total de 48 pessoas e  92 armas. As reservas de alimentos e remédios abasteceriam a guerrilha por uns 4 meses. Faltavam roupas, calçados, facas, pilhas, bússolas e os recursos financeiros estavam na casa dos quatrocentos cruzeiros. Dá pra perceber que a luta era totalmente desigual.
Mapa de atuação da guerrilha
A LUTA E O FIM DA GUERRILHA
As ações não tardaram a acontecer e se dão na área do Destacamento A. Não houve confronto, pois o grupo já havia se retirado, a ideia era fundir os Destacamentos A e B, sob o comando de Zé Carlos(André Grabois).
Neste período duas tentativas de emboscada foram feitas: a primeira tentativa sob o comando de Nelito (Nelson Lima Piauhy Dourado) e com a ajuda de moradores da região, preparou-se uma emboscada na estrada, mas as tropas não passaram pelo local. A segunda, preparada por Osvaldão, também tentou atacar tropas pela estrada Transamazônica, mas as tropas mudaram o percurso, não passando pelo local da emboscada. Houve a tentativa de se destruir uma ponte, mas o material disponível não foi suficiente para a empreitada.
O grupo de Ari (Ariovaldo Valadão) trocou tiros com os soldados, sem baixas para a guerrilha.
Por imprudência ocorre a morte de três membros da guerrilha. Alfredo (Antonio Alfredo Campos), Zé Carlos,João (Demerval da Silva Pereira) e Zebão ( João Gualberto), foram buscar dois porcos que estavam na roça de Alfredo, quando já estavam saindo do local foram surpreendidos por uma patrulha que abriu fogo contra os três que morreram imediatamente. João conseguiu fugir, mas perdeu a arma. Após essas baixas, a CM necessitou fazer outro remanejamento.
Poucos dias depois outra baixa por imprudência acontece. Sônia (Lucia Maria de Souza) e Manuel(Rodolfo de Carvalho Troiano), foram ao encontro de dois companheiros. Houve a recomendação para não usarem o  pizeiro* antigo, pois não era seguro. Sônia não atendeu a recomendação e ainda para no caminho para molhar os pés e beber água, quando foi surpreendida por pela patrulha que  desferiu-lhes vários tiros. Muito ferida, Sônia tenta fugir. Segundo relato de alguns moradores, a patrulha lhe perguntou o nome, ao que foi respondido “Sou uma guerrilheira que luta pela liberdade”, ao que é respondido “Queres liberdade, então toma”. Sônia foi morta com mais de 80 tiros. Manuel conseguiu fugir ao ouvir os tiros.
As baixas estavam aumentando, a situação estava crítica pois além das mortes ocorreram muitas prisões e sob tortura vários esconderijos de comida e remédios acabaram sendo relatados aos militares, que iniciaram a asfixia  dos recursos disponíveis pela guerrilha. Sem alimentos, remédios e ajuda da população, agora apavorada, foi ficando impossível reverter a luta.
Em novembro as áreas de atuação dos Destacamentos A,B e C já estavam todas palmilhadas pelas forças de repressão, e mais uma baixa de peso ocorre. Desta vez Osvaldão, negro forte e alto, um dos fundadores da guerrilha, muito querido na região, é traído pelo mateiro Piauí. Que leva a patrulha aonde Osvaldão o aguardava para pegar farinha. O guerrilheiro, que era  ex militar foi morto com um tiro certeiro no coração. O seu corpo chegou dependurado de ponta cabeça pelo helicóptero do Exército. Era o troféu que os milicos tanto queriam.

*Pizeiro:caminho na mata muito pisado e cheio de rastros.

 No mês de dezembro mais baixas atingem a guerrilha, do Destacamento B-C caem  Jaime (Jaime Petit da Silva) e  Ari é encontrado degolado, provavelmente por um membro infiltrado, chamado Jonas, que desapareceu depois do ocorrido. São presos e desaparecem os companheiros Chico (Adriano Fonseca) , Doca (Daniel Calado) e Simão (Cilon da Cunha Brum.
No dia de Natal ocorre o pior ataque,chamado pelas forças de repressão de Chafurdo de Natal. O ataque é feito por helicópteros que metralham o acampamento. Nele estavam os guerrilheiros: Dina (Dinalva Oliveira Teixeira), o Velho Mário (Maurício Grabois), Paulo (Paulo Mendes Rodrigues),Pedro ( Gilberto Olímpio Maria),Joca (Líbero Gincarlo Castiglia), Tuca(Luiza Augusta Galippe), Luiz (Guilherme Gomes Lund),Zeca( José Humberto Bronca), Lourival(Elmo Correia),Lia ( Telma Regina Cordeiro Correia) e Lauro (Custódio Saraiva Neto).O ataque é ouvido por outro grupo  que vinha para formar uma só coluna composto por Chica (Sueli Yomiko Kanaiama),Lourival (José Lourival Paulino),Raul (Antonio Teodoro de Castro) e Mané (Rodolfo de Carvalho Troiano).
Após o Natal, já não havia mais guerrilha, o que havia eram jovens mortos de fome, doentes com malária, exaustos. Foram esses os últimos a caírem, mas não caem mais pela luta, e sim pela covardia do Exército brasileiro em assassinar pessoas famintas.
A realidade agora era outra,em duas campanhas o Exército foi humilhado por 60 jovens que acreditavam num país melhor e que ousaram não só pensar diferente, sonhar diferente, mas em fazer o diferente acontecer. Esses jovens pagaram com a vida o sonho de serem e fazerem a liberdade nascer nos céus do Brasil.
                “É impossível esquecer esse lugar. Ali estão os restos de meia centena de jovens que um dia sonharam com um Brasil melhor. E lutaram uma guerra perdida, por suas próprias convicções.Perderam, mas serão menos brasileiros, por pensar diferente.”[3]

 [3] Livro:Xambioá-Guerrilha no Araguaia Pg.250 e 251.

Roteiro dos cemitérios clandestinos

Bibliografia:
Fontes Primárias
JORNAL DO BRASIL 22/03/1992 ;Primeiro Caderno/Pg.19
JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO 24/09/1972-Relatório sobre a Segunda Campanha do Exército
JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO 08/07/1996- Primeiro Caderno- Brasil Pg.9
BRHISTÓRIA,Revista mensal, editora Duetto, março de 2007, Artigo de Hugo Studart, baseado no diário do Velho Mário (Maurício Grabois) pgs. 16 à 27
Fontes Secundárias:
CABRAL,Corrêa Pedro.Xambioá-Guerrilha do Araguaia.RJ,Ed.Record,2° Edição, 1993
GARIBALDI,A. in Angelo Arroyo-Relatório das Forças Guerrilheiras. Guerrilha do Araguaia 1972/1982.SP,2° edição,1982
OLIVEIRA,Denise Santos de. A Guerrilha do Araguaia nos seus últimos dois anos:Organização e Luta da Guerra Civil que o Brasil não viu. TCC(monografia de finalização de curso) História, Unisuan, novembro de 1996
MOURA,Clóvis.Diário da Guerrilha do Araguaia.SP,Ed.Alfa-Omega,3°edição, 1985
Por:Denise Oliveira, julho/2012