segunda-feira, 27 de outubro de 2014

O Sanhaço, a Jaguatirica e a Arapuca.



A coisa aconteceu mais ou menos assim.
O sanhaço desceu até a beira do rio Chipió para beber água. Aí, ele viu aquela coisa muito estranha... Não era bicho, nem planta e também não era pedra ou tronco velho caído, apodrecendo no meio do caminho. Tratava-se de algo que ainda não se tinha visto por aquelas bandas. 
Parecia a toca de algum bicho, ou o ninho de algum passarinho bem grande, mas tinha folha por cima como se fosse o chão do mato. Além disso, ele estava com fome e lá dentro tinha sementes de sei lá o quê...
A curiosidade dava para matar, porém algo dizia escondido dentro da sua cabeça: "- Não entra... Você não vai gostar."
Ele rodeou, rodeou, olhou , bicou dos lados, subiu em cima. Não acontecia nada. Tudo estava na mais perfeita paz... Dava para confiar: aquilo que estava ali era aquilo mesmo e não costumava ser diferente, portanto, enquanto houvesse luz no céu, (por que de noite as coisas mudam...), só iria acontecer o que já tinha acontecido em algum lugar e ali se repetia.
A confiança vem sempre acompanhada da ousadia e o receio cuidadoso de antes foi trocado por uma displicência abusada. Ele subiu outra vez por cima daquele trem, bicou seus ramos de novo, meteu meia cabeça pra dentro, entrou e saiu daquela toca, se protegeu nela da chuva, que caiu perto do meio-dia, usou e abusou do direito de não prestar atenção nos perigos que o rodeava e até tirou onda dormitando mais para dentro do que para fora daquele troço. Dava para confiar, aquele negócio não iria lhe fazer mal, pois não passava de uma toca abandonada.
Foi aí, na hora da confiança despropositada, que apareceu não se sabe da onde uma jaguatirica braba, que veio cheia de fome para cima do sanhaço. O passarinho estava tão desprevenido e ficou tão assustado, que esqueceu que sabia voar e espavorido correu para dentro daquele negócio que, de repente, fechou-se em cima dele fazendo um barulhão tão grande que espantou até a jaguatirica.
Hoje em dia o sanhaço canta numa gaiola e pertence a um menino que, na maior parte das vezes, lhe trata com muito carinho e nunca deixa faltar sementes e água. Jamais pensa que poderia ter voado, ao invés de cair na arapuca, e é muito agradecido ao moleque que o salvou da jaguatirica.


Por: Carlos Ditzz, outubro de 2014









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